Luis Felipe Miguel
Quando as treze colônias ganharam independência da Inglaterra e formaram os Estados Unidos, criaram uma confederação muito frouxa. Não existia presidência. De fato, não existia um poder executivo central. O Congresso era praticamente o único órgão da confederação.
A Constituição escrita na Filadélfia, dez anos após a independência, teve como objetivo criar um governo de fato para a União, que se sobrepusesse ao governo dos estados confederados (a partir daí, federados). A decisão de escolher o presidente pelo Colégio Eleitoral se baseava em três motivos. Primeiro, a desconfiança na escolha popular direta. Segundo, a possibilidade de barganha entre os delegados, a fim de alcançar soluções mais consensuais.
Com as campanhas presidenciais abertas - que fazem com que o eleitor vote num candidato a presidente, não num delegado ao Colégio Eleitoral - e, ainda mais, com a obrigação de que os delegados votem no candidato escolhido, o segundo motivo deixou de existir, arrastando consigo o primeiro.
O terceiro motivo era evitar que os estados populosos tiranizassem os menores. É a mesma razão para que exista um Senado com a sobrerrepresentação dos estados pequenos. A lógica era que as lealdades primarias dos cidadãos permaneceriam com os estados, não com a União. Cada um se sentiria mais "norte-carolinense", "massachussetiano", "pensilvânico" ou "virginiano" do que - como eles gostam de dizer - "americano", isto é, estadunidense.
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Isso também já foi pras cucuias há muito tempo. A manutenção do Colégio Eleitoral, levando a situações como a de agora - com a vitória de um candidato que perdeu no voto popular -, é uma bizarrice. Faz parte do mito, que eles gostam de cultivar, de que a Convenção da Filadélfia era tão incrível que escreveu um documento capaz de guiar um país para todo o sempre. Uma Constituição escrita para uma sociedade escravagista, com um território que era uma fração do atual, na época em que a lâmpada elétrica era a maior novidade da tecnologia: esse documento seria apropriado para o mundo atual.

Um dos últimos livros de Robert Dahl se intitulou How democratic is the American Constitution? Ele mostra como se trata de um documento datado, que precisaria ser completamente reformado, mesmo sob a perspectiva de um regime democrático liberal. O fim do Colégio Eleitoral é a medida mais óbvia da lista.