Pela primeira vez, Estados Unidos experimentam o golpismo ao estilo latino-americano


A CIA, que está se metendo na política doméstica, participa de uma conspiração para negar a decisão constitucional da eleição de Donald Trump.

Entrevista realizada pelo jornalista uruguaio Efraín Chury Iribarne com o sociólogo estadunidense James Petras, professor da Universidade de Binghamton (NY) e autor de vários trabalhos sobre questões políticas da América Latina e Oriente Médio, para a Rádio Centenário, do Uruguai.

Pergunta: você sabe que as notícias que difundimos na América Latina são surpreendentes, porque falam de uma alteração nas eleições norte-americanas através da intromissão da Rússia. Como se está vendo isso nos Estados Unidos? Qual é a opinião de Trump? O que dizem os democratas? O que disse Hillary Clinton a respeito?

Petras: Bom, poderíamos começar enfatizando a importante gravidade do que está ocorrendo. Não é nada que um golpe. Um golpe institucional, que busca negar a eleição de Donald Trump. Está sendo orquestrado por instituições como a CIA, como forma de ilegitimar o novo governo e tentar acusá-lo de traidor do país.

Ou seja, querem transformar Trump num traidor, um cúmplice da Rússia, e dizer que os serviços de inteligência estão envolvidos, e que não só enganaram o público sobre as eleições, com dados conseguidos pela inteligência russa, mas que querem penetrar o Estado, influenciando nas nomeações para o gabinete de Trump. E para esse golpe, estão mobilizando o Congresso e todos os partidos da direita, do centro e da esquerda, para negar o que ocorre nas eleições.

Ou seja, dizer que Trump é cúmplice da Rússia e que todos os seus colaboradores estão envolvidos nessa farsa. Nada disso está comprovado, são informações inventadas pela CIA, que está se metendo na política doméstica, participando desta conspiração para negar a decisão constitucional.

É um modelo que utilizaram no Brasil, no Paraguai e em Honduras. Países onde um setor dos governos atuais utilizou algum mecanismo falsificado para derrubar o presidente legítimo e tomar o poder. O caso que vemos agora nos Estados Unidos é inclusive pior, porque acusam o presidente eleito de traidor, de possuir ligação com um poder estrangeiro que é inimigo dos Estados Unidos. Barack Obama, um presidente que se meteu em todos os problemas mundiais, intervindo em todos os golpes, agora quer repetir o mesmo cenário em seu próprio país. E, pela primeira vez na história, temos uma versão do golpismo latino-americano dentro dos Estados Unidos.

A imprensa burguesa, a imprensa liberal e a imprensa supostamente de centro-esquerda, estão implicadas, e repetem todas as acusações de traição, de conspiração russa, sem apresentar nenhuma prova definitiva, ou mesmo uma questionável, nada.

Trump está respondendo de uma maneira específica, está preenchendo os cargos com militares e multimilionários, como contrapeso às instituições que Obama lançou contra ele. Existe uma disputa de poder interessante aí, uma luta de elites.

Com os militares nomeados em cargos ligados à segurança, Trump está criando um poder de militares que poderiam resistir ao golpe organizado pela CIA. Com os multimilionários, está justificando suas relações com a Rússia, e as demais propostas que tem sobre a mesa. Precisamente, o novo chanceler é ex-diretor da Exxon, a empresa petroleira mais importante do mundo, bastante vinculada no comércio com a Rússia, e isso também significa marcar uma posição forte.

Finalmente, Trump fez uma viagem por diferentes cidades, enchendo estádios, para reagir aos setores de esquerda e centro-esquerda que se lançaram como comparsas dos golpistas.

Estamos numa situação que parece uma guerra civil clandestina, porque está ocorrendo, em grande parte, dentro da institucionalidade. Uma guerra do FBI contra a CIA, os militares contra os congressistas, os multimilionários entre si, um setor contra outro. E isso não fala em nenhum meio de comunicação, nem os críticos nem os que apoiadores do processo político atual.

Acreditamos que esta é a realidade porque estamos acostumados a ver o que acontece na América Latina nos últimos anos, e observamos que há uma réplica norte-americana desse processo, que podemos entender melhor tendo estudado os últimos golpes institucionais latino-americanos.

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