Reinaldo Del Dotore
Votei pela primeira vez em 1982.
Votei pela primeira vez em 1982.
Meu voto, naquela tão esperada eleição, foi para Franco Montoro. Um político de primeira linha, que fez um ótimo governo. Montoro era um homem público progressista e corajoso. Dialogava, e olhava pelos estratos menos favorecidos. Anos mais tarde, Montoro ajudou a fundar o PSDB . (Ele, hoje, caso fosse ainda vivo, teria vergonha do que se transformou seu partido.)
Nesses 32 anos, eu jamais deixei de votar, para um único cargo. Sempre votei para presidente, senador, deputado federal, deputado estadual, governador, prefeito e vereador.
Votei conscientemente em excelentes candidatos que honraram meu voto, como Montoro, Erundina, Suplicy, Haddad, Lula. Votei conscientemente em candidatos que acabaram me decepcionando ou me traíram, como Dilma e Marta. Votei sempre, até mesmo quando não se tratou de votar no melhor, mas no "menos ruim".
Sempre votei, porque, tendo meus candidatos ganhado ou perdido, meus votos ou os votos opostos aos meus sempre foram respeitados.
Fui oposição a FHC, Alckmin e Serra (e ainda sou) em função de convicções de caráter ideológico, social, econômico, etc. Em uma palavra, oposição de caráter programático. Não obstante, sempre respeitei suas vitórias, pois refletiram a vontade da maioria. É por isso, por exemplo, que, ainda que eu considere negativo o governo Alckmin em função das políticas públicas que ele defende e implementa, considerarei sempre uma tentativa de golpe a hipótese de se desejar que ele não termine seu mandato sem que haja fundamento jurídico para isso (e não há).
Este ano, porém, meu voto deixou de ser respeitado. Não só o meu, mas os votos de 54 milhões de cidadãos. Dilma (que, reitero, me decepcionou) foi retirada a fórceps do cargo por meio de um pretexto jurídico que deu início a um processo exclusivamente político.
É por isso que recuso-me, após 32 anos, a votar novamente.
Peço perdão por insistir nesse tema, mas não vejo alternativa racional a não ser denunciar a ilegitimidade da "democracia" brasileira pós-2016. Não vejo lógica em votar em bons prefeitos ou vereadores se o próprio funcionamento do sistema democrático ruiu.
Não me contento com migalhas selecionadas de cidadania. A Democracia, como diriam os Titãs... "A gente quer ela inteira, e não pela metade".
Votar para prefeitos ou vereadores, neste triste domingo seria dizer: "OK, vocês me roubaram mas vou continuar jogando". Para mim, o jogo acabou.