Luis Felipe Miguel
Sob certo ponto de vista, Trump é o presidente ideal para o jornalismo estadunidense. Permite recuperar seu élan heroico e reencenar o combate da "verdade contra o poder".
É claro que a mídia dos Estados Unidos sempre foi um braço do establishment. Para não ir muito longe, basta lembrar como legitimou a guerra do Iraque, ecoando acriticamente os argumentos falsos do governo ("armas de destruição em massa"), ou como avalizou as medidas de restrição das liberdades civis após o 11 de setembro, incluindo o USA Patriot Act (que é um acrônimo para o ridículo nome Uniting and Strengthening America by Providing Appropriate Tools Required to Intercept and Obstruct Terrorism).
A narrativa que os principais órgãos de imprensa dos EUA estão construindo tem pelo menos um fundamento real: eles de fato estão resistindo à decadência que a administração Trump impõe a determinados códigos de civilidade e respeito que tinham sido conquistados nas últimas décadas.
Ridículo mesmo é ver os jornais brasileiros tentando surfar nessa onda e se apresentar, por espelhamento, como sendo também os paladinos da verdade e da independência em relação ao poder, eles que são cúmplices da fratura da democracia e do retrocesso generalizado no debate público.