Luis Felipe Miguel
O grande triunfo da direita no Brasil foi a construção do antipetismo. Foi uma produção coletiva, ao longo de muitos anos, parte aproveitando expressões mais ou menos espontâneas, parte baseada num trabalho quase científico de confecção de opinião pública. O caldeirão que cozinhou o antipetismo juntava a frustração de alguns, o ressentimento de outros, um conjunto de preconceitos arraigados, começando pelo preconceito de classe mas não se limitando a ele, e o apego à distinção social, no sentido de Bourdieu.
Seu alvo, o "petismo", inclui centralmente o PT e seus governos, mas não se limita a eles, englobando também outros partidos progressistas, o sindicalismo, os movimentos populares e, enfim, tudo o que cheire a esquerda.
O antipetismo propiciou a base popular para o golpe e continua ativo na proteção do atual governo. As medidas do governo Temer são lesivas para a esmagadora maioria das brasileiras e dos brasileiros, incluindo quem vestiu a camisa da CBF e foi pedir a destituição de Dilma Rousseff. Muitos, porém, por mais que não estejam contentes com o usurpador, se refugiam no êxtase de ter derrotado o petismo; e recusam o combate a qualquer coisa que venha do novo governo por temor de contribuir para o renascimento do arqui-inimigo.
A questão é saber o quanto teremos que retroceder antes que a realidade se sobreponha à construção ideológica e faça essa classe média se entender como oposição ao governo. E se a sobrevivência da ideologia antipetista não faça com que uma parcela importante dela acabe optando por uma oposição pela extrema-direita.